Ricardo.
Ricardo sou,
nasci indagorinha, com um coração tão
grande quanto o mundo e talvez mais feroz que um leão em posição de ataque. Minha
presa? A vida, essa aqui em baixo de um seixo, e ali perto passa um pequeno
córrego. Se escorre um pouco, há prazer na água tocando meu corpo pequeno e
grande em sonhos. Ao me levantar o raio de sol batendo em meu rosto moreno, é
uma sensação de prazer indescritível.
Idas e vindas
dentro da água limpa, um espetáculo fantástico de uma espera. Uma luz ali,
minha grande esperança. Minha dor necessária no suspiro primeiro, não
esquecerei jamais. Pioneiro respirar poético. Ufa! Eu pensei isso sim, uma
onomatopéia única num momento religiosamente bonito. Uma dependência tão
aconchegante que até as rápidas ausências do cheiro de minha mãe, me deixava um
tanto choroso. Papai me olha do vidro de fora, seu olhar se enche de lágrimas,
a espera finalmente tinha começado. A luz me incomoda, nem sei se chama isso de
luz, mas deve ser a luz mesmo, lugar excessivamente iluminado. Por mim,
voltaria agora mesmo para o ventre de minha mãe Camila, lá o líquido amniótico era
um banquete dos deuses. Que saudades daquele tempo. Um jantar imensamente
compartilhado. Mamãe comia uma maçã, eu comia suflê de maçã. Ah! Que saudades
de minha casa primeira. Foi uma espera que durou nove segundos, ou foram nove
milênios? Ou noves fora, xis ao quadrado, fórmula de Baskara, daquela matemática
que ainda aprenderei? São perguntas que meu coração agora nem desconfia que se
esforçará em responder, também isto não importa. Meu objetivo de agora em
diante será abrir os olhos. Quero ver meus pais, quero ser quem sabe
historiador, que nem meu pai sugestionou outro dia, ouvi ainda bem baixinho,
afinal separado pelo muro de carne, a barriga da minha mãe, só deu para ouvir o
sufixo “dor”. Posso ser também quem sabe, aviador, laminador ou até mesmo sofredor,
se acaso chegar a torcer pelo São Paulo Futebol Clube...
Apenas durmo
agora, embalado por minha mãe. Antes menina, depois senhorita, um pouco antes
de terminar estas letras, se chamava Camila, nascida e criada no seio da
dedicação, do esforço e da paciência, mestre e doutora das leis de poucos. Apenas
durmo um pouco Ricardo e um pouco mais Ricardinho vou logo loginho querer engatinhar. Anseio tanto não me perder de tanto
dormir, se não minha avó Maria me pega em sonho mesmo, igual fazia com meu pai
Eduardo. E onde está o pai de Ricardo mesmo? Ah! Certamente está por ai,
perdido em sonho, não tem paciência de acordar, vive no mundo do sono, só para
não perder minha mão. E eu ele dormiremos mais um pouquinho, nós dois agora,
pai, filho, mãe, amigos e família, somos uma só carne, esperando que sejamos
logo acordados para a vida, pois se não, o sol entra na nossa bunda, e aí vocês
vão ver a festa.
Obrigado
papai, mamãe, família e amigos, desculpe a demora, mas eu dormi um pouco mais e
perdi a hora. Ainda dá tempo de comemorar meu nascimento?
Atenciosamente,
Ricardo
Coração de Leão Braga de Oliveira.
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