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Mostrando postagens de julho, 2014

Diário de um pai ansioso: 37ª semana de gestação da Sophia.

Minha mãe sempre me dizia que mentir era feio, mas mesmo assim, eu permaneço mentindo descaradamente. Minto quando digo que não estou nervoso com o seu nascimento, minto mais ainda quando digo não temer se serei um bom pai e a mentira se torna ainda maior quando digo aos outros que estou preparado. Preparado eu diria se fosse fazer uma prova de concurso ou vestibular, a qual já expus meus conhecimentos inúmeras vezes, com vitórias e muitos fracassos, porém em relação a você, nossa filha Sophia, reitero minha incapacidade de ter certezas quanto a que tipo de pai serei. Como seu avô Antônio é meu padrão de pai, acho um ótimo começar por ele, depois eu vejo que espécie de pai posso ser, talvez com defeitos, chatices, mas sempre alguém que ama e cuida de quem ama.  É certo minha querida Sophia, que você está sendo ansiosamente esperada, é como se eu e sua mãe Giselen estivéssemos com um presente delicadamente embrulhado pelo período de nove longos meses. Cada dia, transmutado em seman

Pela escola que há em mim: Homenagem a Escola Marcello Cândia, subsede Bairro Marcos Freire e aos Formandos de 2004.

Acordo assustado, mamãe gritando no meu pé do ouvido: "Levanta menino, tu vai te atrasar pra escola... E chama aí tua irmã", como se com a voz estridente e ressonante, já não tivesse tirado minha irmã de seu sono sacro. Mesmo à contragosto, levanto a cabeça, porém o corpo desobedece a ordem originada de meus poucos neurônios ainda ativos. Insisto novamente nesse intento hercúleo, porém apesar das minhas "boas intenções", minha mãe interfere, serenamente, com sua voz que ecoa, algo semelhante a algum cântico monástico, repetido e mimetizado por mim, quando ela diz: "Olha eu tô só falando pra tu levantar, agora se eu for aí, eu te puxo dessa cama e te dou um banho, e tu vai pra escola de couro quente", penso que palavras podem doer tanto quanto a realidade.  Levanto e espero minha hora de ir banheiro. Entro naquele lugar úmido e de chão gélido. Escovo os dentes com os olhos fechados, cumpro somente o estrito das regras de higiene pessoal. Visto meu unif

Segredo entre um pai e Sophia

Sophia, minha filha acorda do teu avô Antônio, peça que ele faça um café, que eu vou comprar pães e, enquanto isso, diga à sua mãe que frite os ovos, mexidos, está bem? Vá até sua mãe e peça moedas de saudades, veja se é possível comprar amor com moedas. Desconfio que não, mas vale a pena tentar. Olha mas não acorde sua avó Nilva, ela está cansada por demais, passou a noite inteira pensando na sua festa de boas vindas.  Depois Sophia caminhe até a cama, acorda sua tia Guidu e diga à ela que o sol já raiou e o que banho está à sua espreita, apenas aguardando o momento para a libertação da água no corpo. Em seguida pegue sua bicicleta, e pedale como uma menina louca, com "coidado" para não cair e se estrebuchar toda, siga minha orientação, porque dói muito joelho/asfalto/sangue, e pai que é pai, até fica chateado às vezes, mas sempre quer o bem dos filhos.  Pedale um pouco mais, depois mais, mais e mais, quando chegar no fim da rua dobre à direita no Sítio Vista Alegre

Sophia, me ensine a aprender a escrever.

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Filha, filhinha, fecha a janela, esse vento forte e frio pode te deixar gripada. Pequena gotinha de vida, abro a janela do teu sonho e só o que vejo lá dentro é alegria e esperança, não há como esconder-se de mim, seu filho feito menino. Levante Sophia, me ajude, por gentileza, a andar sem medo de cair e peço que me ensine a aprender a escrever, preencher papéis, ainda os vejo todos em branco, umas histórias, talvez, por se escrever e outras tantas para se contar aos velhos amigos nunca esquecidos. Filhinha não me deixe passar calafrios e dores noturnas, dê-me um cobertor bem quentinho, se possível cor de rosa, seria-me mui agradável, dormir tranquilo e lembrar que amanhã o dia não tem fim. Não tem relógio que desperta, não tem sol que entra pela fresta da porta e não tem nem lua que faz gente dormir. Tem é sim aconchego, leite, choro, dor, soluços, e que por serem muitos não sabem eles rimar com cor. Espia só fia, cuide de mim por gentileza, porque quando eu for criança

Espera

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No escuro do meu quarto penso que você, a qualquer hora noturna, vai bater à porta, e me dirá com um sorriso estridente: "Pai, cheguei! Bença pai!", e eu, balançando a cabeça da confirmação, direi apenas "Deus te abençoe minha filha". Minha filha? Como pode um pai querer ser o dono de sua filha? Isso não há de ser assim. É um paradoxo por de mais cansativo pensar essas coisas, gostaria mesmo era de somente beijá-la fraternalmente, e esperar que me dissesse, "Pai me ajuda no dever de casa?", a qual diante da minha paciência já tão conhecida, iria caminhar até a mesa de estudos e a ensinar a matemática que eu juro, juro, que fingirei saber resolver os tais problemas. Esperar nem sempre é tão chato, existem esperas boas e magníficas, como quando sua mãe Giselen, faz macarronada com beijo ou mesmo aquele pudim de paixão. A espera não se torna assim uma tortura com T maiúsculo, mas sim algo de uma doçura poética. Ah! Sophia como esses meses foram de apre

A tarde que tive com Ivan Junqueira: Entre livros e chuva.

Era uma tarde a qual me lembro um tanto chuvosa, e eu sozinho caminhava até a livraria. Não sei agora de onde vinha e nem me recordo para onde, talvez, iria eu naquele dia qualquer. Obrigações forçadas sendo cumpridas, e um aperto no coração de, sei lá, não conseguir concluir às que ainda faltavam serem cumpridas. Ao entrar na loja fiquei encantando com tudo, os livros, as revistas com capas de mulheres nuas, os contos românticos, livros de história, enfim, as estantes abarrotadas de uma organização inesquecível, e sobretudo, invejável, ao que me pareceu instantaneamente ir de encontro com minhas aspirações humanas, tornar-me um não ser organizável. Caminhei, olhei os preços, apaixonei-me pelas capas com mulheres que eu nunca vou amar, conversei comigo, lembrei que tinha pouca dinheiro na carteira, olhei para a vendedora da loja e tornei-me a desconfiar de mim mesmo como um possível ladrão de livros. Enfastiado com a dor da pobreza, quis ser eu capitalista rico para comprar um bom liv

Diário de um pai ansioso: Sophia entrando na 34ª semana

Bom Sophia minha filha, se você está lendo esse trecho é porque venci, pelo menos no tocante a alfabetização tu começaste com o pé direito na vida. Minha querida filha, tu não deixa tua mãe dormir a noite, é um mexe para lá é um mexe para cá, isso tem me deixado um pouco preocupado. Tenho a leve impressão que a marca da minha mão vai ficar gravada em seu rosto intrauterino, morada atual, e logo logo lugar sozinho à espera de um irmão ou irmã, quem sabe. No início tive medo de pensar à vida divida a dois, agora que já passei por essa fase psicológica, penso na vida à três, Eu, você e sua mãe, vidas à trezentos. Porque trezentos? São tantas pessoas que torceram para que você viesse a este mundo, uns chamam isso milagre, outros recorrem a explicações às mais mirabolantes possíveis, eu penso que pode ser tudo isso aí e muito mais.  Engraçado minha filha, que você nem nasceu ainda, e eu já faço planos do que poderíamos fazer juntos quando você do meu lado, eu te olho, e vejo sua mãe, v