A tarde que tive com Ivan Junqueira: Entre livros e chuva.
Era uma tarde a qual me lembro um tanto chuvosa, e eu sozinho caminhava até a livraria. Não sei agora de onde vinha e nem me recordo para onde, talvez, iria eu naquele dia qualquer. Obrigações forçadas sendo cumpridas, e um aperto no coração de, sei lá, não conseguir concluir às que ainda faltavam serem cumpridas. Ao entrar na loja fiquei encantando com tudo, os livros, as revistas com capas de mulheres nuas, os contos românticos, livros de história, enfim, as estantes abarrotadas de uma organização inesquecível, e sobretudo, invejável, ao que me pareceu instantaneamente ir de encontro com minhas aspirações humanas, tornar-me um não ser organizável. Caminhei, olhei os preços, apaixonei-me pelas capas com mulheres que eu nunca vou amar, conversei comigo, lembrei que tinha pouca dinheiro na carteira, olhei para a vendedora da loja e tornei-me a desconfiar de mim mesmo como um possível ladrão de livros. Enfastiado com a dor da pobreza, quis ser eu capitalista rico para comprar um bom livro do Marx materialista, que eu custo a ler e continua a não entendê-lo ainda, ainda há esperança. Respiro ares de livros novos, caminho por entre os livros velhos, faço o transcurso de uma verdadeira epopeia por dentro daquele mundo chamado corredor de livros. Alcanço o inesperado de minhas lembranças sobre poesia, e meu amigo Diego diz-me repetidamente que "poesia é pouca letra para muito papel", contrariando-o, eu insisto em olho, pode ser que ele esteja certo, não sei.
Com pouco dinheiro se compram poucas coisas, assim vejo que ainda me sombram uns trocados para talvez comprar um livro de História, mas algo estranho aconteceu ali naquele corredor. Vi e fiquei estarrecido diante do livro, relativamente, grosso, com a capa escrito "Poemas Reunidos" Ivan Junqueira. Quem era esse autor? Folhei as páginas, e não vi nada que me chamasse atenção. Fechei-as. Abri novamente o livro, e por insistência, após certificar-me de que ninguém estava olhando, resolvi ler um dos poemas, e eis que caiu no poema que dizia assim: "E seu eu disser que te amo?" Foi como se o poema tivesse pulado para cima de mim, senti algo tão estranho, de forma que a metafísica das coisas terrenas tornaram-se incompreensíveis. Espelhos cercaram-me. Eu gostaria de ter escrito aquilo, falado sobre aquilo e com aquilo ter dito por minhas próprias palavras, eu quis, juro que quis, cometer um mero plágio. Infelizmente naquele instante, mostrou-se improvável cometer tal crime, mas mesmo assim decidi adquirir tal livro. Porque ninguém chegou antes e comprou antes de mim. Seria aquele poeta tão desconhecido assim? Seria aquele poema menor?
Após comprá-lo fiz como qualquer sujeito que gosta de poesia faz, pesquisei sobre a vida, trajetória, livros escritos por Ivan Junqueira, foi quando me dei conta da minha pequenez, diante da grandeza daquele poeta magnífico. Em tempos em que o Orkut era um gélido espaço social para a troca de informações e fotos, e o SMS ainda era utilizado com maior frequência, senti que sabendo eu mais sobre Ivan Junqueira, teria uma certa vantagem sobre os perigos reservados a mim pela vida. Nunca tinha pensado em amor à primeira vista, mas que foi inexplicável aquele encontro ao acaso com aquele livro naquela prateleira, isso é ainda me deixa assustado.
Pois bem no dia 03 de Julho de 2014 morreu o poeta, crítico literário, tradutor e ensaísta Ivan Junqueira, eu nunca o conheci pessoalmente, e ele nunca ouviu falar de meu nome. Mas mesmo que postumamente quero agradecê-lo por suas poesias, que me fizeram enxergar a vida de maneira diferente, e principalmente transformar o acaso de um encontro em uma paixão constante.
Obrigado Ivan, por ser essa "Sagração dos Ossos", eles ainda estão em mim.
Distrito de Extrema, 08/07/2014 às 15h23.
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